sexta-feira, 3 de junho de 2011

Da inutilidade de mim ...

E aí descobri que o amor é isso, algo maior do que eu e que se entranha no mundo e não tem volta. Aquilo que não se tem controle quando sai de você e que aos poucos é fisgado no emaranhado da vida como uma rede que te pesca quando está distraído.

No início é só contemplação e tudo fica claro. Mesmo a escuridão da noite é tomada por certa luz e as sombras passam a ser relevo de você no mundo.

Mas depois, quando se dá conta de que tudo mudou, de que agora você não é mais você e sim outra pessoa, você passa a ser coisa - não aquela pensante mas coisa que sente, que pulsa. Coisa de carne que desconhece verbos e adjetivos, que é incapaz de dizer o que sente e por isso sangra o tempo todo. Você só consegue juntar as patas, olhar pra cima e pedir amor, comida e carinho, como se as grandes teorias, os grandes pensadores, os maiores monumentos não fossem bastante para explicar o que se sente.

E no fim ... não ... ele não tem fim ... Porque ele se transforma, transmite como epidemia e pronto. Você agora não é mais nada diante dele e ele nem precisa de você. É aí que você se sente dispensável, o que na verdade você é: completamente inútil, sem graça e sem vida. Pois não são das suas formas que ele precisa, tampouco dos seus atos e palavras. Não, ele precisa, por um curto espaço de tempo, apenas da sua alma.

E eu que sempre desconfiei que a minha alma sempre foi um pequeno retalho. Nada mais ...



domingo, 10 de abril de 2011

Bela

A Bela aparece como num surto sem avisar e tira o sono. Quem pensa que é essa tal  pra perturbar a paz angelical do repouso? O que pensa saber da vida para esfregá-la na minha cara e devolvê-la em frescor.
As luzes se acenderam e agora o palco está iluminado, estou pronta para reapresentar sem ensaio. Agora o improviso me toma e recito um monólogo sem diretor. Não existe persona: sou eu no coração e na carne viva que vibra, em todos os lados.

Tudo é claro e vejo o rosto de todos na platéia, mas há algo estranho pois todos eles sou eu, parecem comigo e me olham. São cerca de cinquenta olhos castanhos, rostos redondos, cabelos curtos e almas em construção. Mas por cima de cada uma existe o reflexo da Bela. Ela fala no ouvido, olha no fundo da carne e lembra a humanidade que existe em cada uma de mim. É assim que ela me quer, protagonista no palco e olhar na platéia ao mesmo tempo.

Que venham as Musas então e me tomem no ventre, gerem em mim amor, desejo e paixão para saber mais, viver mais e ser mais alma. Que eu encontre a medida certa para fazer o lençol que irá cobrir os sonhos devassos e os gestos desnudos desta delicada alma.

Desta Bela alma ...





terça-feira, 5 de abril de 2011

Para o príncipe que bebeu a àgua do rio Alétheia

Nas nossas rodas infantis eu era rainha e você principe.
O pano da cama era o palácio e os brinquedos nossos súditos.
Os banquetes de bolachas cream craker eram a sensação,
e assim a vida passava com cheiro amarelo.

Mas um dia o principe se aborreceu e trancou o amarelo na masmorra.
Chamei o bobo da corte mas ele não riu,
Pintei seu busto com verde mas ele não gostou,
E assim tudo que era sonho virou realidade.

Ele parou de enchergar o amarelo,
Me disse que a vida era dele e que seus sonhos também.
Que não eram súditos aqueles velhos brinquedos,
E que a ilusão era a arma dos tolos.

Segui então meu caminho e construí outros castelos,
Arrumei os mais belos vitrais e deixei os muros baixinhos por onde entravam a plebe, os reis, animais, mendigos, crianças, amores e vários tons de amarelo.

Enquanto ele desbotava cada vez mais ...
Sua cria gritava por calma, amor e paciência.
A matriarca urrava de dores e desconsolo.
E aquela que era seu amor foi virando dias costumeiros.

Agora chega o terremoto.
Castigo das Deusas ao esquecido principe.
Sua cria foi a primeiro a pular o murinho do castelo.
O amor demonstra num pequeno sorriso segundos de paz e confiança,
Mas o príncipe não quer voltar à magestade.

Talvez porque seja difícil carregar as pedras do castelo,
Ou mesmo porque esqueceu das borboletas que o ajudariam.
Mas a força da Terra é violenta demais para aguentar,
E, que pena, a masmorra tomba a cada dia.

As portas do meu castelo estão baixas, mas não completamente.
Não há nada de realeza deixar o príncipe impune.
Ele se deixou esquecer a verdadeira lição da felicidade,
e agora as Deusas da floresta estão lhe dando a chance de relembrar o amor.

Venha príncipe, não tenha medo de morrer,
Deixe que as roupas de gala se remendem,
que os pássaros arrumem a mesa com outras bolachas,
traga sua cria e seu amor para brincarmos juntos.

Mas venha logo,
pois a vida não perdoa os príncipes machões e covardes,
e o ensinamento das Deusas dizem que as vezes é tarde demais.
E bem na superfície de minha cara ainda resiste um sonho de que o amarelo ainda pode se salvar.


Oração para as Mulheres


Que as Deusas abençõem as bruxas queimadas e aquelas que ainda serão;
Que dêem maestria às prostitutas e que vinguem os corpos das violadas,
que energizem com força os ventres das mães solteiras para que deles nasçam o amor,
que encham de coragem o peito das matriarcas pobres e cansadas do labor.

Que soltem a voz das companheiras ainda em silêncio pelo medo;
que matem os machos podres e feridos pela inveja da força que temos.

Deusas, rogai pelos nossos seios, vaginas, pernas e bundas
que tenhamos a cada dia o prazer de saber porque somos.

Santas e devassas que derramaram sangue, gozo, suor e esperanças pelo mundo;
fazei de nossas lutas uma só.

Fabiana Melo Sousa - 08/03/2011


quinta-feira, 31 de março de 2011

Nesta madrugada Orfeu salvou Euridice de Hades

Nesta madrugada Orfeu salvou Euridice de Hades
Ela, morta e insegura, grita por seu herói para ele resgatá-la do inferno.
Em meio a mortos vivos ela grita e pede socorro pois seus companheiros não a escutam.

Até que Orfeu escuta o grito, pega a sua harpa e voa.
Euridice tem medo por não saber o que fazer
pois se sente desnuda diante da salvação.

Porém ela se rende, ele a coloca num cavalo branco
e segue seu cortejo de salvação encantando onde passa.
Ela agradece.

Assim hoje Euridice dorme em seus mantos cheirando a lavanda.
enquanto imagina o que deve se passar na cabeça deste Orfeu.
Então deixa que o corpo vença a sua morte e segue assim para o outro dia.

terça-feira, 29 de março de 2011

Pílulas ...

Tenho medo dos intolerantes que se definem como radicais ou apaixonados e empurram no precipício toda a beleza do mundo.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Hoje fui resgatada por uma deusa ...

Fui enganada por toda a vida;  me disseram que um dia eu ia mudar, que eu seria menos radical e que entenderia que o mundo é assim mesmo e acabou ... Que Deus um dia iria entrar na minha vida e que Ele - macho, viril e soberano -  poderia me ajudar a encontrar o sentido das coisas.

Queimem no marasmo aqueles que arrotam inteligência, pois batem no peito e se orgulham do tempo que lhes levou a juventude e deixou certezas. Covardes que se escondem atrás da desculpa da idade. Eles deveriam morrer antes de matarem a inocência ou ficarem mudos sem ter tempo de dizerem aos jovens que quando o tempo passar virá o equilíbrio. Meio-termo oriental de filosofia de esquina.

Não merecem saber que no mundo existem Deusas que relembram os nossos pecados, alisam nossos defeitos e exaltam a nossa ira. Lambem com sal nossas feridas e trazem consigo o perfume verdadeiro da vida.

São elas que nos ensinam a não crescer,  Deusas que tomam de assalto a vida de quem deixa. Elas abrem o mundo de incertezas, mandam para o inferno qualquer bom costume. Tiram as nossas roupas, abrem nossos ventres e geram luz.

Nos ensinam sobre nada, fecham a matraca da verdade, não perdoam covardias, amam os defeitos e as falhas. Leem nossa alma em nossos olhos e falam a nossa boca. Nelas o silêncio é lição daquilo que se deve aprender a ler.

Depois de hoje não quero mais deus. Sou devota da Deusa que mata e me ressuscita todos os instantes. Sou escrava daquilo que não sei o nome e me dá medo, mas que me dá vida. Esta que não se ensina, se encanta.

Para Minha Borboleta.