domingo, 11 de setembro de 2011

Minha mãe me abandonou para a vida.

Num pequeno instante, olhando os olhos de minha mãe, um olhar distante e inseguro, olhos quase-velhos e inocentes. Foi olhando dentro destes olhos que me vi, reconheci a mim mesma embora não fosse parte de mim. Era outra pessoa.
Dentro deles eu encontrei a troca, não mais a segurança pois tudo era aberto e incerto. Não havia amor incondicional ou compaixão, éramos adultas, por vezes meninas e no fim duas.

Eramos duas em suas escolhas, eu escolhi nascer daquele ventre, ela escolheu me dar a vida. Naquele instante, nem o acaso da natureza, nem o projeto de deus, nem os grandes sábios. Eramos vida: ela saíra de meu ventre, se alimentara em meus seios, dormira em meu colo e depois, na adolescência da vida, me trocara pelo mundo. A mim restou envelhecer e olhar aqueles olhos, perceber o quanto somos duas, o quanto ela me permite ser e apenas isso.

Sem agradecimentos, sem obrigações, sem amor eterno, sem culpa e sem medo. Ela, apenas, me deixou seguir e por isso não me pede nada em troca. Com isso me permite retornar em seus olhos e me deixar espantar pela vida, permite que eu continue sugando de seu corpo aquela seiva carnal. Aquilo que se faz vida apenas por ser. Nada mais.

Naquele pequeno instante, acredito que, cresci.

Para minha mãe, que me abandonou para a vida.

Um comentário:

  1. Esse sim é um mergulho sensato e descalço em você, por você no mundo das coisas mutáveis.

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